O BEIJO NO ASFALTO - A IDIOSSINCRASIA HUMANA
- Artur Nicoceli
- Dec 23, 2018
- 3 min read
Updated: May 21, 2019
“Beijar alguém a beira da morte é tão bonito”, disse Lázaro Ramos enquanto fazia o personagem principal da trama de Nelson Rodrigues. O autor bebe da mesma água que Machado de Assis, já que da mesma forma que entramos no embate se Capitu traiu Bentinho, nós também nos questionamos se Arandir conhecia o homem que ele beijou no meio da praça da bandeira antes do mesmo morrer.
A trama gira em torno de um Brasil tradicional pregado pelos preceitos bíblicos em que a família consiste no homem, a mulher e sua prole, distinguindo de qualquer ação humana e do bem aqueles que forem LGBTI+. Quando um homem resolve beijar outro homem, após o mesmo ter sido atropelado por um ônibus, a ocasião transforma o ato em uma disputa policial investigando sobre a real masculinidade do atuante envolvendo as relações familiares dos personagens.
Nelson Rodrigues realça de forma minuciosa exasperadamente as ações humanas e os trejeitos individuais de cada personagem. Entrelaçado com o conceito de Rousseau – “O homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe” é a prova concreta de que o único ato de humanidade, denominado o beijo no asfalto altera todas as filosofias internas dos personagens, demonstrando o real de cada personagem.

(fonte – adorocinema)
A antropologia de Nelson é exaltada em diversos textos teatrais que abarcam um certo público remanescente das minorias necessitadas “de algo”, não necessariamente elas são a escória humana como a classe média alta poderia chamar, mas literalmente as relações entre as classes independente de qual elas (personagens) pertençam.
“O beijo no asfalto” é mais uma dramaturgia sobre a idiossincrasia humana e Murilo Benicio dirige de forma exemplar a leitura dramática com grandes atores do teatro brasileiro, como Fernanda Montenegro, que em determinados momentos faz comentários sobre como foi a montagem do mesmo na época ditatorial e outras atrizes que fizeram a personagem que ela faz.
A escolha pela narrativa em preto e branco também deve ser realçada, porque foi uma escolha do diretor de fotografia Walter Carvalho com a proposta de distanciar o público dos personagens, derrubando o conceito do teatro da verdade (aquele que o ator precisa ter vivido uma história parecida para poder exercer o personagem) e trazendo uma proposta de análise da encenação.
“O beijo no asfalto” é a prova concreta de que a cultura é a necessidade individual do homem, pois só a mesma pode criticar de forma analítica as relações humanitárias de construção social transformando em arte aquilo que não pode ser traduzido em apenas palavras e esse é um filme que as pessoas que pretendem acabar com o ministério da cultura ou não incentivar os artistas deveriam ver para entender um pouco sobre o que os mesmo estão pedindo como direito. A arte é direito humano e não de uma classe segregacional e individual.

(fonte – adorocinema)
O longa foi apresentado na 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2017. E conta com o elenco excepcional Otávio Muller, Augusto Madeira, Luiza Tiso, Stênio Garcia, Lázaro Ramos e Fernanda Montenegro.
No entanto, a maior problemática do filme é que está passando em cinemas considerados cult, como Itaú cultural e Caixa Belas Artes. Uma crítica ao próprio público da arte é que eles optam em enaltecer as produções hollywoodianas e esquecem que o Brasil também é capaz de produzir filmes memoráveis como esse. A divulgação do mesmo também não foi algo à se prezar, pois pouca propaganda foi encontrado nas redes sociais sobre a exibição do filme.
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