ESPECIAL OSCAR 2019 - MELHOR FILME
- Luis Henrique Franco e Carol Fung
- Feb 19, 2019
- 9 min read

A noite do Oscar se aproxima, e com ela se elevam nossas expectativas para qual será o grande vencedor da noite. Oito filmes disputam esse ano pelo prêmio máximo, abordando temáticas das mais variadas, desde a vida simples de uma empregada no México até o combate ao racismo e à Ku Klux Klan nos anos 70, passando pelas manobras de poder de um vice-presidente ambicioso e pelos dramas da corte da Grã-Bretanha, analisando a vida de grandes cantores e nos levando a uma nova nação do universo Marvel.
Cada um à sua maneira, os indicados a Melhor Filme conseguem trazer discussões pertinentes na atualidade e nos fazem refletir sobre os assuntos mais polêmicos de uma maneira profunda. Confira abaixo um pouco mais sobre essas produções que têm tudo para se tornarem sucessos aclamados.
INFILTRADO NA KLAN

Escrito e dirigido por Spike Lee, teve seu roteiro baseado na história real de Ron Stallworth, um detetive negro que nos anos 70 comandou uma investigação sobre a Ku Klux Klan. Stallworth se infiltrou na “organização” e se tornou um dos muitos heróis americanos que a história não cita por pertencerem às chamadas “minorias”.
O longa que é estrelado por John David Washington (Stallworth) e Adam Driver (Flip Zimmerman), foi indicado à Palma de Ouro e levou o Grand Prix do Festival de Cannes em 2018.
Spike Lee prova, através do roteiro do longa, ser um cineasta que tem algo a dizer e que não irá se calar. A história nos faz experienciar uma completa imersão em uma sociedade extremamente intolerante. A partir da visão de um jovem negro que sonhava em ser policial, o filme expõe todo o racismo que transbordava na policia americana.
A trama construída por Lee prende a atenção do começo ao fim com a simples utilização de recursos ligados à comédia. O filme em geral tem um tom irônico que fortalece a critica à supremacia branca e à extrema-direita e faz crescer o sentimento de indignação no expectador. Vivemos tempos muito sombrios e vemos a todo momento lideres que reforçam o discurso de ódio às minorias. Lideres de países influentes voltaram a falar abertamente sobre seus sentimentos racistas, xenófobos, misóginos e machistas. O enredo do filme já é completamente crível por termos a certeza de que não se trata de uma ficção e esse fato se torna ainda mais sólido quando é exibido para um publico que está vivendo novamente essa realidade.
Lee usa sua voz com maestria e atinge com o longa os mais diversos públicos e é exatamente a trama chocante que é construída que nos faz refletir sobre o futuro que merecemos.
ROMA

Um filme quase auto-biográfico do diretor Alfonso Cuarón, Roma retrata a vida de uma família de classe alta do México, seu dia-a-dia e seus dramas, tudo narrado pelo olhar da empregada da casa, Cleodegaria Gutiérrez. Com um enredo focado nesse dia-a-dia, o filme alterna entre o drama dentro da casa e os problemas pessoais de Cleo e a maneira como ela tenta equilibrar os dois em sua vida.
É muito interessante ver um filme como esse sendo indicado ao Oscar e, mais do que isso, já ser um dos favoritos ao prêmio. Sem grandes momentos de ação, é um filme que se constrói de uma maneira simples e que não tenta extravagâncias ao mostrar os problemas da família e de Cleo, justamente porque esses problemas são extremamente comuns no mundo real, e a maneira realista como o filme trata deles nos aproxima mais ainda dessa condição e nos faz sentir ainda mais empatia por sua protagonista.
Todos os elementos do filme trabalham para compor o panorama da vida da protagonista, e a normalidade com que isso é tratado proporciona um ganho ainda maior de sentimentalismo para a trama, construída justamente para nos fazer refletir sobre o quanto tudo aquilo poderia acontecer (e acontece) com qualquer pessoa do mundo e como esses acontecimentos são muito mais costumeiros do que nós, habituados a uma posição mais privilegiada na sociedade, sequer podemos pensar.
BOHEMIAN RHAPSODY

O filme é vendido como uma biografia de Freddie Mercury, mas apesar de realmente contar a sua história, há algo muito mais importante e grandioso que o filme conta e é o que o torna especial. O longa nos mostra a relação dos integrantes da banda, a confiança em Freddie, a família que formavam, as brigas pequenas e as brigas que os afastaram, mas que fizeram com que vissem a importância de continuarem juntos. É lindo ver a forma como o roteiro nos coloca dentro da trajetória deles e nos faz sentir como se fossemos parte dessa família, assim como eles faziam quando subiam no palco e puxavam o público pra fazer parte da banda. O roteiro tem a alma da banda e isso é exatamente o que traz um grande diferencial, fazendo-o não ser apenas mais uma biografia.
Outro ponto importante é a humanidade com que retrataram Mercury, que na época era visto como uma pessoa promíscua, apesar de ser um artista insubstituível. No longa vemos uma imagem mais humana, com muitas críticas à imprensa e às pessoas que se aproveitavam da fragilidade do vocalista para se divertirem.
O filme além disso tem um equilíbrio muito legal entre cenas dramáticas e cenas musicais em que todo o público tem vontade de cantar. É um filme feito para toda a família e especialmente é uma linda homenagem ao vocalista e um presente a seus fãs.
GREEN BOOK

A temática do racismo foi um dos temas mais recorrentes dessa Corrida do Oscar e, comparado a outros longas, como Infiltrado na Klan e Se A Rua Beale Falasse, Green Book parece tratar dessa questão extremamente séria de uma maneira mais descontraída, usando bastante de humor e de uma situação de amizade entre os personagens de Viggo Mortensen e Mahershala Ali para tratar de todos os problemas que negros enfrentavam na década de 60 e ainda enfrentam nos dias de hoje.
Um “road trip” que se baseia muito na mensagem de Conduzindo Miss Daisy, Green Book trata de identidade pessoal e consegue colocar alguns toques de drama bem realizados em meio ao seu tom de comédia em geral. Sua mensagem certamente é bem-intencionada, mas parece falhar em atingir a todos na audiência da mesma maneira e muitos detalhes da trama acabam sendo mal-interpretados devido a essa tendência do filme de não querer ir tão a fundo em suas questões.
É certamente um filme muito bonito e bem feito, com boas atuações e uma história envolvente, que certamente merece estar entre os indicados. No quesito de mensagem, porém, parece ficar um pouco para trás. Além disso, a grande quantidade de polêmicas envolvendo a família do músico Don Shirley, representado na trama por Mahershala Ali, e uma possível associação de um dos produtores com apoiadores do governo Trump, parecem ser fatores que tendem a afastar esse filme do prêmio final.
A FAVORITA

O longa é lindo visualmente. É como se olhássemos telas vindas da antiguidade clássica e fossemos levados com maestria pra dentro de uma realidade agora muito distante da nossa. Os vestidos, os palácios, as perucas usadas pela corte e todo o seu modo de vida são trazidos em um visagismo muito rico e a imersão proporcionada por uma fotografia e uma direção espetaculares.
Ao mesmo tempo em que somos levados a essa antiguidade clássica, o roteiro do filme nos apresenta conflitos completamente modernos. Como os transtornos psicológicos, o adultério e a homossexualidade sendo mostradas na grande tela sem medo algum. Esse é um dos maiores presentes da modernidade, afinal, ver as coisas normais com a normalidade que elas tem e não com o preconceito de uma mente retrógrada.
Ao misturar em um perfeito equilíbrio a antiguidade e as questões modernas, temos uma linda crítica mostrando que desde que o mundo é mundo esses conflitos são cotidianos, o amor não vê sexo, cor ou religião e que transtornos mentais são normais e qualquer um pode sofrer com eles, e que na verdade o maior problema do ser humano é sempre pensar apenas em seu próprio bem.
PANTERA NEGRA

Um dos maiores triunfos desse ano foi certamente o de ver um filme da Marvel ser indicado a Melhor Filme do ano. E esse feito não poderia vir de outro filme se não Pantera Negra, que explorou a fundo todas as possibilidades fornecidas por seu universo ficcional de criar um ambiente rico e um povo com uma cultura extremamente diferenciada, misturando um tradicionalismo tribal com uma tecnologia extremamente avançada.
Pantera Negra pode não ter tido as melhores atuações do ano, nem os melhores efeitos especiais vistos em um filme da Marvel. O roteiro também se prende a aspectos da conhecida fórmula Marvel. No entanto, essa fórmula é moldada e ampliada nesse filme para nos fazer adentrar ainda mais no universo de Wakanda. Mais imersivo do que outros filmes ao adentrar um novo reino ou local, o filme consegue criar uma nação com uma cultura própria que, ao mesmo tempo, une diversos aspectos de diferentes culturas africanas e as respeita e exalta. Esse é o grande e maior feito desse filme.
Não só em seu respeito a essas culturas, Pantera Negra também aborda discussões extremamente importantes na atualidade de uma maneira extremamente madura para um filme de heróis, mais que ainda se encaixa na temática do filme sem parecer forçado. Discussões como o racismo, a ajuda entre os povos e o isolamento geográfico são abordados como problemas verossímeis dentro de Wakanda, o que contribui ainda mais para a riqueza dessa nação fictícia e para o sucesso desse filme.
NASCE UMA ESTRELA

Nasce Uma Estrela é o quarto remake de uma história que começou lá nos anos anos 30. O longa é o primeiro trabalho como diretor do ator Bradley Cooper, que também estrela o filme ao lado da cantora Lady Gaga.
O que eu acho importante destacar é que ao observar as outras 3 versões da história, vemos que cada uma trouxe em seu enredo uma mensagem importante sobre o meio artístico de sua época. O esqueleto da história é sempre o mesmo, mas seus personagens, suas trajetórias e a mensagem é feita sob medida pra cada época.
O remake de agora é feito com muita inteligência pra um um mundo onde a indústria da música se preocupa muito mais com batidas e letras superficiais do que com a verdade e a arte de músicos que lutam a vida toda por espaço. Os músicos então começam a se moldar a essa realidade e muitas vezes fazem sucesso com letras superficiais, e até se sujeitam a ficar conhecidos como artistas pobres, e anos depois se revelam como os grandes artistas que realmente são.
Além disso, em um mundo repleto de estímulos constantes e em uma indústria cruel onde as cobranças são triplicadas, e você pode estar desempregado e esquecido do dia pra noite, lidar com transtornos psicológicos virou algo de extrema importância. Discutir isso em um veículo de comunicação em massa como o cinema é algo importante, mas ao mesmo tempo perigoso. Creio que nesse longa a abordagem tenha sido feita com muita sensibilidade, mas quase atravessando a linha limite do gatilho psicológico.
VICE

Vice é um filme complexo. Vindo do diretor Adam McKay, que já havia trabalhado esse tipo de temática em A Grande Aposta, esse novo filme mostra a elevação de Dick Cheney a vice-presidente dos Estados Unidos e a um dos homens mais importantes do mundo. E o diretor não demonstra medo de se embrenhar nesse mundo polêmico e trazer temas e bordões muito próprios da situação de seus personagens.
O mais interessante é a capacidade de McKay de fazer isso de uma maneira a explorar o humor, a sátira e a crítica com base em piadas, tornando o que poderia ser um filme extremamente tedioso em uma experiência divertida para o público e, ao mesmo tempo, esclarecedora. O impacto que a denúncia sob a forma de comédia cria é muito maior do que se tudo fosse apenas explicado nos mínimos detalhes.
Soma-se a isso um conjunto de atuações exemplares de um elenco de peso, que não se contém em interpretar personagens extremamente odiados da história americana atual. Christian bale e Amy Adams dão ao casal Cheney toda a frieza predatória que os fizeram ser repudiados em anos atuais, enquanto Sam Rockwell chega a dar pena como George W. Bush, um playboy que não consegue controlar nem mesmo seu próprio governo. Tudo isso para abordar um passado recente da política americana que, de uma maneira que mais soa como um tapa na cara, se associa muito fortemente com o estado atual das coisas.
QUEM PROVAVELMENTE VAI GANHAR:
É de nosso consenso que Roma foi uma surpresa enorme durante essa temporada de premiações. O filme de Alfonso Cuarón conquistou inúmeros prêmios, desde o Critics Choice Awards até o BAFTA. Tudo isso já coloca a produção como franca-favorita ao Oscar. Além disso, o filme traz uma beleza gigantesca ao tratar da simplicidade da vida cotidiana de uma forma contundente e sentimental. Um tipo de filme que não se vê todo ano no Oscar, mas uma indicação mais que bem-vinda na premiação.
QUEM DEVERIA GANHAR (LUÍS): Acredito que o prêmio de Melhor Filme desse ano deveria ir para A Favorita. Além de suas atuações fortes, que já angariaram outros prêmios esse ano, o filme conta com um visual muito bonito e que remete à época de uma forma extremamente artística. Além disso, a maneira como a mensagem do filme foi bem trabalhada por seu diretor ajuda para tornar esse filme um dos maiores do ano que passou e dos últimos anos também.
QUEM DEVERIA GANHAR (CAROL): Se eu fosse responsável pela votação na academia, não pensaria duas vezes antes de dar a estatueta para Infiltrado na Klan. O filme me tocou de diversas formas desde que o assisti e creio que um bom filme é aquele que não sai da nossa mente. Além disso, Spike Lee construiu muito bem a trama e criou um filme extremamente necessário pros dias de hoje, premiá-lo não seria somente artístico, mas seria uma forma de protesto.
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